CADES – Conselho de Defesa do Meio Ambiente Desenvolvimento Sustentável e Cultura de Paz de São Paulo (SP) à Secretaria Municipal de Verde e Meio Ambiente – SVMA, Secretaria Municipal da Habitação – SEHAB
Assunto – Áreas de Proteção e Recuperação de Mananciais APRM
Desde quando foi criada a Lei de Proteção de Mananciais ( Leis Estaduais 898 de 18 de dezembro de 1975 e 1.172 de 17 de novembro de 1976) as Áreas de Proteção e Recuperação de Mananciais – APRM foram sendo ocupadas principalmente por moradias da população de baixa renda. As ocupações deram-se com tamanha rapidez e volume que impossibilitaram a fiscalização que deveria impedir a derrubada de árvores para dar lugar às construções.
O grau de gravidade é tal que não é exagero afirmar que as APRMs estão caminhando para a extinção. O diagnóstico preciso é que as APRMs encontram-se no meio de uma luta, um confronto. De um lado o déficit habitacional ou seja, a falta de moradias para a população de baixa renda e do outro, a necessidade de preservação ambiental. Diante da impotência e até mesmo da leniência do poder público a questão habitacional prevaleceu sobre a ambiental como pode-se ver nas assustadoras imagens disponíveis no Google. Estima-se que hoje nada menos que 2 milhões de pessoas morem nas APRMs em favelas e barracos – ou “habitações sub-normais” conforme classificação do IBGE.
Ultimamente o problema agravou-se com a chegada do crime organizado por volta de 2010 de acordo com dossiê elaborado pelo ex-vereador Gilberto Natalini (disponível em FINAL_Dossie2_VersaoFinal.pdf (natalini.com.br) ) documento que tornou-se a principal referência no assunto.
Transcrevemos aqui parte da introdução do dossiê com destaque em negrito para o faturamento com a venda dos lotes.
Introdução
DESTRUÍRAM A MATA ATLÂNTICA PARA EMBOLSAR DINHEIRO
Todos os dias dezenas de árvores da Mata Atlântica são criminosamente derrubadas no Município de São Paulo. A maior parte da cobertura vegetal vai ao chão na Zona Sul da Cidade para que organizações criminosas implantem loteamentos clandestinos em áreas de proteção ambiental. As temperaturas de São Paulo sofreram aumento de 2º C nos últimos 50 anos. Para os cientistas, a melhor resposta ao problema – a mais rápida e eficiente – é o plantio de árvores. Diretor do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, Marcos Buckeridge defende quadruplicar o número de árvores no Município.
Calcula que existam 650 mil árvores nas vias públicas e praças da Cidade. “Poderiam ser 3 milhões”, diz ele. As árvores retiram gás carbônico (CO²) da atmosfera e o armazenam em troncos e galhos.
Por ora cientistas apontam que o plantio de 1 trilhão de árvores em todo o Planeta poderia ajudar a neutralizar as emissões de carbono provocadas pelo modelo de sociedade com base na petroeconomia. Se as “organizações” que derrubam a Mata Atlântica em São Paulo para pôr no lugar bairros clandestinos continuarem livres para agir, temperaturas elevadas e poluição atmosférica substituirão árvores, e esgotos a céu aberto e águas contaminadas tomarão os cursos de água, córregos e do que ainda resta de água limpa que chega às Represas da Guarapiranga e Billings. Milhares de nascentes que abastecem as duas represas vão desaparecer. Se nada for feito, terá sido esse o “desenvolvimento” do extremo da Zona Sul.
Em 29 de Maio de 2019 o Vereador Gilberto Natalini requereu a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para 7 investigar a devastação das áreas verdes e de proteção ambiental no Município de São Paulo. Vereadores que defendem os interesses políticos da Prefeitura, porém, não permitiram o funcionamento da CPI, cujos trabalhos de apuração certamente vinculariam a destruição da Mata Atlântica aos objetivos econômicos de organizações criminosas que transformavam as florestas em loteamentos clandestinos. Em Agosto de 2019, a Primeira Edição do Dossiê “A Devastação da Mata Atlântica no Município de São Paulo” (acessível por meio do site www.natalini.com.br) listava 90 áreas dentro do território da Cidade que já haviam sido desmatadas nos últimos cinco anos ou vinham perdendo os respectivos remanescentes de cobertura vegetal nesse período. Do total, 46 áreas foram medidas. Somavam quase 3 milhões de metros quadrados – espaço suficiente para 500 mil árvores. Ou seja, meio milhão de árvores tinham ido ao chão em cinco anos em São Paulo ou estavam sendo derrubadas naquele momento. Em seu lugar, caso lograssem êxito, grupos estabeleceriam 20 mil lotes clandestinos (150 metros quadrados cada um, somando as áreas em comum). Vendidos a R$ 50 mil o lote, proporcionariam faturamento de R$ 1 bilhão – dinheiro suficiente para subornar quem fosse necessário e ainda assim garantir bons lucros.
Os 11 primeiros casos de destruição da Mata Atlântica aqui registrados fizeram parte de um parecer técnico da Engenheira Agrônoma Maria Elena Basílio (a íntegra está na Primeira Edição do Dossiê). Todos ficam em Área de Proteção dos Mananciais. A Mata Atlântica – Floresta Ombrófila Densa, ou floresta tropical pluvial, tem a característica de proteger os mananciais hídricos. Como se vê, o que resta de Mata Atlântica é imprescindível à saúde do sistema de abastecimento de água da Região Metropolitana. As árvores são estratégicas para assegurar boas condições de vida a milhões de pessoas em São Paulo
Diante deste quadro desolador os conselheiros de CADES resolveram elaborar este manifesto solicitando do poder público especial atenção ao problema. Para os conselheiros o enfretamento à questão requer investimentos em moradia popular, as conhecidas HIS – Habitação de Interesse Social – ressaltando-se a necessidade da criação de um plano habitacional específico para as APRMs. A SEHAB não informa em seu site o número de famílias que moram de aluguel na periferia de São Paulo mas o fato é que se nada for feito certamente os moradores vão comprar lotes clandestinos oriundos de atividade criminosa como revela o dossiê Natalini
Entretanto, construir HIS para atender à demanda por moradias nas APRMs não significa construir nesses locais. Pelo contrário, quando o governo constrói grandes conjuntos habitacionais ou equipamentos públicos de grande porte nas APRMs está só ajudando a consolidar e estimular ainda mais as ocupações irregulares além de contribuir para aumentar o espraiamento da mancha urbana em direção aos mananciais e ao cinturão verde que envolve a metrópole e faz parte da Reserva da Biosfera assim classificada pela UNESCO em 1994
Memórias do Instituto Florestal (infraestruturameioambiente.sp.gov.br)
Existem áreas ociosas mais próximas ao centro onde já há estrutura pronta de transporte e saneamento básico que podem receber HIS. Algumas vezes são bairros inteiros que mudaram de perfil no início dos anos 70 quando São Paulo deixava de ser industrial para tornar-se uma cidade de serviços. Ao construir HIS nesses bairros, além de evitar a derrubada de mais árvores na periferia o governo estará utilizando a infraestrutura já existente e contribuindo para o adensamento da cidade, tema que tem sido recorrente nas discussões sobre Plano Diretor Estratégico – PD
Reiterando, a reivindicação dos conselheiros de CADES é a elaboração de um plano habitacional voltado especificamente para as APRMs sem o que estaremos assistindo de braços cruzados à extinção desse precisoso patrimônio natural da metrópole.
Não podemos aceitar a desculpa de que não há dinheiro. Somente neste ano de 2023 a prefeitura anunciou dispor de superavit de $36,6 bilhões em caixa (link abaixo) o que daria para construir 366 mil moradias HIS
Dinheiro parado no caixa da Prefeitura já rendeu R$ 1,5 bi em juros | Metrópoles (metropoles.com)
Isto sem falar que o orçamento previsto para 2024 e já aprovado pela Camara Municipal é de $107,3 bilhões
Portanto há dinheiro. O que falta é a vontade em resolver o problema
Precisamos agir antes que seja tarde demais
São Paulo 28 de Junho de 2023
Conselheiros de CADES