O CORTE NA VERBA DA SAÚDE

Eu participo do trabalho e da luta para a construção de um sistema público de saúde no Brasil desde 1970. De lá para cá “correu muita água debaixo da ponte”, como diz o ditado popular.

Conseguimos com muita mobilização social que o Sistema Único de Saúde, construído por mãos e mentes do chamado “partido sanitário brasileiro”, fosse aprovado na Assembleia Nacional Constituinte.

Foi escrito no texto constitucional que “Saúde é um Direito do Povo e um Dever do Estado”.

Foi uma vitória imensa da nossa causa.

Passada essa fase, tratava-se de implantar o SUS no Brasil.

Isso foi feito por meio das Leis Orgânicas da Saúde, a Lei 8080 e a Lei 8142.

Desde o início da década de 90, até a presente data, houve uma grande tarefa do Setor Saúde e dos agentes políticos, Federais, Estaduais, Municipais, Filantrópicos e Privados, de construir e implantar, aquilo que chamamos de a maior reforma do Estado Brasileiro, que foi, e é, o SUS.

O SUS deve por lei, prestar atenção à Saúde, de forma integral, gratuita e universal. Deve também praticar a promoção, prevenção, tratamento e reabilitação em saúde, agindo de forma hierarquizada, regionalizada e descentralizada e ainda incorporar o Controle Social através dos Conselhos de Saúde, nos 3 níveis de Governos e em cada Unidade de Saúde.

O SUS é um Sistema Público de Atenção à Saúde, mas que pode e deve compor com as instituições filantrópicas e privadas para ampliar o atendimento à população.

Mas qual é o problema do SUS que gera tanta reclamação do povo brasileiro, colocando a saúde como uma das principais queixas da população.

O SUS, desde que foi criado, sempre foi SUBFINANCIADO.

Nunca teve, em nenhum momento, os recursos suficientes para cumprir seu papel constitucional. Pelo contrário.

O financiamento da Saúde no Brasil caminha numa realidade de altos e baixos, mas mesmo nos melhores momentos o dinheiro público da saúde sempre foi muito aquém do necessário.

A luta pelo financiamento justo para o SUS persiste até hoje.

Em Outubro de 2000, após uma enorme mobilização nacional, o Congresso Nacional aprovou a PEC-29, de autoria de Eduardo Jorge e Waldir Pires. O Ministro da Saúde, era José Serra e eu era Presidente do CONASEMS (Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde).

Essa PEC aprovada obrigou a vinculação da verba da saúde, fixando 15% de mínimo dos orçamentos municipais, 12% dos estaduais e 5% do PIB variável para o federal. Nós preconizávamos 10% no mínimo do orçamento federal. Não conseguimos.

Essa Lei permitiu um respiro no orçamento do SUS, com entrada de dinheiro novo, que facilitou a ampliação do atendimento na saúde.

Mas logo o Governo Federal começou a diminuir sua participação, e ele que participava com 65% do bolo total das verbas do SUS, hoje colabora com pouco mais de 40%.

Em seguida o Governo Federal começou a congelar parte do orçamento da Saúde, sendo que, de 2004 a 2014, houve um contingenciamento de cerca de 240 bilhões de reais do orçamento do SUS. Ou seja, em 10 anos, o Governo Federal usurpou o orçamento de um ano inteiro do Ministério da Saúde.

De 2018 a 2022, o SUS sofreu um ataque de desmonte a partir do comando do Ministério da Saúde, com ministros absolutamente incompetentes, irresponsáveis e negacionistas.

Foram momentos muito difíceis, que os demais entes federativos, Estados e Municípios, cumpriram um papel de gestão, em plena pandemia de COVID, onde o Governo Federal deixou de cumprir sua tarefa, e passou a desmontar políticas públicas consolidadas por décadas, como por exemplo, o Sistema Nacional de Imunização, entre muitas outras desconstruções.

O SUS resistiu a isso tudo, e ainda deu uma demonstração de competência e dedicação ao povo brasileiro.

Hoje, com o aumento dos serviços, da demanda, dos insumos, podemos dizer que o SUS padece da mesma deficiência financeira, embora as verbas tenham subido nos valores absolutos.

Em palavras simples, somando-se todas as verbas federais, estaduais e municipais, e dividindo-se pelo número de brasileiros, o SUS tem 3,8 reais, por pessoa, por dia, para fazer suas 4 tarefas: promoção, prevenção, tratamento e reabilitação em Saúde.

É muito pouco! Pouco demais!

Assim, embora tenhamos ampliado a atenção básica (são quase 50 mil UBSs no Brasil), e aumentado o número de procedimentos e internações, a oferta de serviços é menor que a demanda por atendimento.

E isso se dá exatamente na atenção secundária e terciária à saúde, nas especialidades e procedimentos mais complexos.

O Brasil investe só 3,8% de seu orçamento na saúde pública, sendo quase o “lanterninha” da América do Sul. E o SUS atende 150 milhões de brasileiros que não têm plano de saúde.

E os outros 50 milhões que têm convênio, quando o caso é grave, são empurrados para os serviços do SUS.

E agora, diante da grave crise fiscal do Brasil, o Governo Lula escolheu a saúde para penalizar, e propõe cortar 4,5 bilhões do orçamento federal do SUS.

A Ciência Médica e a Tecnologia avançam todo dia. O custo da saúde se mede em dólares.

A população precisa, quer e merece atendimento. Os profissionais de saúde querem, precisam e merecem ser reconhecidos.

O SUS precisa ampliar seu atendimento e ter melhor gestão de gastos.

E o Governo fala e quer cortar as verbas da Saúde.

Uma situação intolerável que exige uma reação firme da sociedade brasileira.

 

Gilberto Natalini- Médico e Ambientalista

 

 

 

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