Ofício 01_250123- PROAM – Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental e OGAM
Ilustríssimo(a)s Senhore(a)s:
Alexandre Corrêa Abreu – Presidente Interino do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDS)
Mauro Vieira – Ministro das Relações Exteriores do Brasil
Marina Silva- Ministra do Meio Ambiente do Brasil
Sonia Guajajara – Ministra dos Povos Indígenas
A presente, tem por finalidade abordar fatos ocorridos por ocasião da recente visita do Presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva à Argentina, ocorrida em 22 e 23 de janeiro do corrente ano.
Na ocasião, afirmou o Presidente que o Brasil estaria disposto a financiar, por intermédio do BNDES, o gasoduto argentino Nestor Kirchner, para transporte de gás de xisto a partir da Patagônia, proporcionando assim meios econômicos de desenvolvimento para o país vizinho.
Mesmo considerando que recursos oriundos do BNDES representem exclusivamente financiamento de bens e serviços a serem destinados a empresas nacionais, observamos:
1 – O chamado gás natural é um combustível fóssil, com alto potencial de aquecimento climático, cujo uso nos coloca na contramão da tarefa global para a redução de emissões, sendo que sua queima em usinas termelétricas provoca fortes efeitos na atmosfera terrestre em horizonte de tempo de 20 anos;
2 – O método para obtenção de gás de xisto é internacionalmente reconhecido por altos riscos e fortes impactos ambientais. Consiste em processo de extração de gás por meio de fragmentação de rochas para liberação dos hidrocarbonetos, provocando a contaminação dos aquíferos sendo, portanto, alternativa de extração de gás ambientalmente inadequada e já banida em países mais progressistas.
3 – Note-se que a perfuração para extração na região remete a ao menos 14 poços de terras de povos originários na região de Vaca Muerta, onde já há operações em mais de 300 poços e que foram palco de confrontos com a comunidade Mapuche, na patagônia argentina, fatos amplamente documentados pela imprensa local. Ressalte-se ainda possíveis implicações com a estabilidade geológica local, que registra aumento de abalos sísmicos.
4 – Lembramos que o Brasil abordou a tecnologia de extração de gás por meio de “fracking” há cerca de 8 anos atrás, quando intensos debates técnicos foram promovidos no Congresso Nacional por meio da Comissão do Meio Ambiente das Câmara dos Deputados, pela Procuradoria Geral da República (Ministério Público Federal), resultando em várias comunicações ao Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), provocando à época declaração contrária à proposta por parte da própria Ministra do Meio Ambiente, Isabella Teixeira.
5 – Diante de tais fatos, inadmissível que o Brasil venha a financiar, por meio do BNDES, essa prática reconhecidamente geradora de impactos ambientais, em áreas onde existe cenário conflitante com reivindicações de povos originários. Portanto, solicitamos que o BNDES se abstenha de aportar recursos públicos brasileiros, em conformidade com seus princípios éticos e dentro da cautela que exige a responsabilidade solidária sobre a geração de impactos ambientais por agentes financiadores, responsabilidade de todos os brasileiros, segundo afirma o caput do Capítulo de Meio Ambiente (art. 225) da Constituição Federal.
Fatos como este justificam a presente manifestação de membros do Observatório da Governança Ambiental do Brasil (OGAm), iniciativa do PROAM, além de especialistas de diferentes áreas do conhecimento, preocupados com a boa governança ambiental do País, que não poderá prescindir do monitoramento de financiamentos que possam ser lesivos ao meio ambiente.
Temos certeza de que os nobres sentimentos externados pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de emprestar apoio financeiro às obras de infraestrutura da Nação Argentina, podem ter por destinação projetos mais adequados à modernidade e sustentabilidade ambiental.
Contando com a visão progressista do BNDES para conduzir iniciativas que sejam condizentes com a implementação de um modelo de Desenvolvimento Sustentável, que deve se dar especialmente por meio de uma ação inter e transdisciplinar do Governo do Brasil, conforme tem defendido a própria Ministra do Meio Ambiente Marina Silva, subscrevemo-nos.
Atenciosamente,
São Paulo, 25 de janeiro de 2023
Carlos Alberto Hailer Bocuhy
Presidente do PROAM-Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental, membro do Observatório do Meio Ambiente do Poder Judiciário, membro da coordenação do Observatório da Governança Ambiental do Brasil (OGAm).
Yara Schaeffer-Novelli
Bacharel e Licenciada em História Natural – Professor Senior da Universidade de São Paulo (USP) – coordenadora científica da Observatório da Governança Ambiental do Brasil (OGAm).
José Rubens Morato Leite
Professor Titular dos cursos de Graduação e Pós-graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), membro do Observatório da Governança Ambiental do Brasil (OGAm).
Luciana Vanni Gatti
Pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) – Membro de Painéis Internacionais para monitorar GEE da Organização Mundial de Meteorologia (WMO), membro do Observatório da Governança Ambiental do Brasil (OGAm).
Luiz Marques
Professor livre-docente do Departamento de História do IFCH – Unicamp, membro do Observatório da Governança Ambiental do Brasil (OGAm).
Sonia Corina Hess
Doutora em Química – Professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
José Carlos Carvalho
Engenheiro Florestal – ex-Ministro do Meio Ambiente do Brasil, membro honorário do Observatório da Governança Ambiental do Brasil (OGAm).
Clemente Coelho Junior
Professor de Ciências Biológicas da Universidade de Pernambuco
Paulo Boggiani
Professor do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (USP).
Gilberto Natalini
Médico, Ambientalista – ex-Secretário de Meio Ambiente do Município de São Paulo, membro honorário do Observatório da Governança Ambiental do Brasil (OGAm).
Coletivo de Entidades Ambientalistas do Estado de São Paulo/SP
Engenheiro Agrônomo Vilazio Lellis Jr (PROAM) – Eng. Vicente de Moraes Cioffi (SESBRA) – Arquiteta Claudia Perencim (ACE Pau-Brasil) – membros do Observatório da Governança Ambiental do Estado de São Paulo (OGAm-SP).
Fórum de Entidades Ambientalistas do Distrito Federal e Adjacências/DF
Carlos Bomtempo – Secretário Executivo da Diretoria Colegiada
Clóvis Cavalcanti
Ex-presidente da International Society for Ecological Economics (ISEE), Pesquisador Emérito da Fundação Joaquim Nabuco, Presidente de Honra da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica.
José Eustáquio Diniz Alves
Ex-Vice Presidente da Associação Brasileira de Estudos Populacionais (ABEP) e Pesquisador Titular Aposentado da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (ENCE/IBGE).
Lisiane Becker Bióloga
Mestre em Biociências – Ex-docente na Faculdade de Medicina/PUCRS – Presidente do Instituto MIRA-SERRA/RS, membro do Observatório da Governança Ambiental do Brasil (OGAm).
Luiz Mourão de Sá
Presidente do Instituto de Desenvolvimento Ambiental – Brasilia/DF – membro do Observatório da Governança Ambiental do Brasil (OGAm).
Vladimir Safatle
Professor Titular do Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo, membro da Coordenação da International Society of Psychoanalysis and Philosophy e ExPresidente da Comissão de Cooperação Internacional (CCInt) da FFLCH-USP.
Marcelo Marini Pereira de Souza
Professor Titular de Política Ambiental da Universidade de São Paulo (USP), membro do Observatório da Governança Ambiental do Brasil (OGAm).
Moema Miranda
Antropóloga, membro da Ordem Franciscana Secular, assessora e integrante do comitê da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM), membro do Coletivo 660.
Pe. Dário Bossi
Missionário Comboniano, membro da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM) e da Comissão Ecologia Integral e Mineração da Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB).
Chico Whitaker
Prêmio Nobel Alternativo (Right Livelihood Award) de 2006 – Ex-Secretário Executivo e hoje Consultor da Comissão Brasileira Justiça e Paz da Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB), cofundador do Fórum Social Mundial e membro do Coletivo 660.
Marcus Vinicius Polignano
Médico, Vice-Presidente do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, Fundador do Instituto Guaicuy/MG, membro do Observatório da Governança Ambiental do Brasil (OGAm).
José Correa Leite
Professor Universitário. Integra o Coletivo 660, impulsiona a Assembleia Mundial pela Amazônia e o Diálogo Global por Alternativas Sistêmicas.
Célio Bermann
Professor Associado 3 no Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo, coordenador do Grupo de Pesquisa em Governança Energética, certificado pelo CNPq, ex-coordenador do Programa de Pós-Graduação em Energia da USP.
Sérgio Haddad
Professor, membro da coordenação da Ação Educativa, membro do Coletivo 660.
Néri de Barros Almeida
Professora titular do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp, ex-coordenadora do Comitê Gestor do Pacto Universitário pela Promoção do Respeito à Diversidade, da Cultura da Paz e dos Direitos Humanos da Unicamp.
Links para referência:
https://exame.com/economia/izabella-teixeira-critica-exploracao-de-gas-de-xisto/
https://www.youtube.com/watch?v=c3udAjPdV-g&feature=youtu.be