O excesso de chuvas tem causado diversos problemas nos últimos meses. Desde dezembro, várias cidades como Cunha, Angra dos Reis e São Luis do Paraitinga se revezaram nas primeiras páginas dos jornais por causa do drama causado pela água. Em São Paulo, a situação não é diferente. As marginais alagam, casas desabam, túneis ficam interditados e o congestionamento aumenta. Para os cidadãos, conviver com esse transtorno significa perder tempo e, às vezes, seus bens materiais, como aconteceu com os moradores do Jardim Romano, na zona Leste.
As chuvas que são comuns neste período vieram excepcionalmente fortes neste ano numa tendência que irá se agravar nos próximos anos. Em 2007, o relatório do Painel Intergovernamental para Mudança Climática da ONU (IPCC, na sigla em inglês) já alertava que um aumento na frequência (proporção do total da incidência de chuvas relativa à chuvas torrenciais) de ‘eventos de forte precipitação’" era "muito provável", ou seja, mais de 90% provável. Diante da relativa segurança dos cientistas de que as temperaturas vão subir nos próximos anos, a recomendação do IPCC – reiterada por cientistas ouvidos pela BBC – é se preparar para uma ocorrência cada vez maior deste tipo de eventos. Não podemos fazer associações diretas entre eventos individuais e o aquecimento global, mas a ciência é bastante clara: quanto mais quente o ar ficar, mais umidade ele é capaz de transportar, o que facilita a ocorrência de chuvas torrenciais. Para uma cidade como São Paulo, que foi construída em torno de uma ampla malha de rios como o Tietê, Pinheiros e o Tamanduateí a adaptação é ainda mais urgente.
Grande parte dos estragos causados em São Paulo pelas chuvas poderia ser evitada se houvesse um melhor planejamento das intervenções humanas. A capital paulista cresceu indiscriminadamente ignorando as condições ambientais impermeabilizando seu território principalmente as margens dos rios e ocupando as encostas dos morros com habitações construídas muitas vezes de forma irregular e em áreas de risco geológico. Nos últimos anos o poder público iniciou intervenções que melhoram a drenagem urbana através de projetos como o 100 parques, o programa córrego limpo, Passeio Livre e a construção de piscinões, mas muito ainda precisa ser feito.
Novas idéias podem contribuir para reverter essa situação e é fundamental que elas sejam mais divulgadas. O asfalto poroso, que tem maior permeabilidade, já existe no mercado e está sendo testado em algumas vias, como na região da Capela do Socorro. Pesquisadores da USP também conseguiram desenvolver um material similar que substituiria o asfalto em áreas de menor movimento, como estacionamentos. Nas calçadas a pavimentação feita com blocos intertravados ou placas drenantes feitas em concreto permeável também facilitam a penetração da água no solo além das faixas ajardinadas nas calçadas verdes. É urgente uma campanha de plantio em larga escala de árvores e que sejam apropriadas aos logradouros públicos.
Outro problema a ser combatido é enorme acúmulo de lixo encontrado nas ruas que faz com que as bocas de lobos, galerias de águas pluviais e sumidouros entupam. É preciso primeiro diminuir a produção de lixo incentivando o reaproveitamento do lixo pela reciclagem ou utilizando na produção de energia para em seguida intensificar a limpeza de bocas de lobo e galerias.
Os problemas que as chuvas estão causando não podem ser apenas uma desculpa para culpar autoridades ou para se lamentar o caos, cada cidadão deve repensar suas próprias atitudes. Sempre que possível é importante cada pessoa O colocar seu lixo em local e horário adequado bem como ampliar a absorção das águas pluviais no terreno de seu imóvel ou condomínio através da ampliação da área verde, uso de concreto permeável no térreo ou construção de mini-reservatórios. É também um bom momento para repensar a ocupação urbana e servir de pretexto para exigir do poder público o comprometimento para colocar mãos à obra e aprofundar as reformas que se mostram necessárias para hoje e para o futuro.
Gilberto Natalini
médico e vereador (PSDB/SP)